sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Fundamentos da Medicina Chinesa (Medicina Chinesa Clássica)

Um excelente artigo ("Science, politics and the making of “TCM”. Chinese Medicine in Crisis"- Heiner Fruehauf - Journal of chinese medicine, number 61, October 1999.), publicado na internet, comenta a respeito da convicção de que a arte da medicina chinesa está morrendo, tanto na terra mãe China como ao redor, principalmente por questões econômicas e políticas.
Nele o autor descreve claramente as diferenças entre a Medicina Clássica Chinesa e a tão famosa TCM (Tradicional Chinese Medicine) exportada e difundida mundo afora.
Não seria coerente traduzir aqui o artigo na integra, já que o leitor pode (e deve) recorrer ao original. Porém, para os menos acostumados à língua inglesa, destaco um dos pontos mais importantes do texto, onde são enumeradas as características da verdadeira Arte da Medicina Chinesa, talvez na esperança de que possamos cultivá-las e mantê-las, que não se percam e não se deturpem.
Não será tarefa fácil...

Abaixo, então, algumas características do que era e deveria continuar sendo a Medicina Chinesa, de como deveria ser seu ensino, de como deveriam ser seus praticantes:

• Baseada na filosofia naturalista (Taoísmo)

• Entendimento alquímico (sintético): esforço científico definido como conhecimento e exploração da complexidade e multidimensionalidade da natureza e do corpo.

• Baseada em parâmetros tradicionais do conhecimento taoísta (yin/yang, wu hsing, bagua, teoria jing-qi-shen, etc.)

• Vê a medicina como um braço das ciências taoístas mães (HuangLao, Zhouyi, FengShui, etc.)

• Orientada para a fonte: confiança e apoio na tradição (experiência)

• Requer vasta base de conhecimento devido ao relacionamento íntimo que possui em relação a outras artes tradicionais e ciências

• O corpo é tratado como um microcosmo que segue leis macro-cósmicas e é continuamente tocado por influências macro-cósmicas (padrões da totalidade cósmica/calendárica/sazonal criadas pela conjunção do sol, lua e estrelas)

• Baseada na experiência subjetiva do homem no ambiente do universo geocêntrico (tem a terra como centro) - (1)

• Baseado na cosmologia dualista do “vir-a-ser” (processo de visão de mundo orientada pela observação das constantes mudanças dos fenômenos físicos, simbolizados pelos padrões mutáveis da lua) (2)

• Visão imparcial da realidade como um contínuo jogo entre céu e terra, luz e escuridão, demônios (Gui: influências lunares) e espíritos (Shen: influências solares), nascimento e morte, masculino e feminino, yin e yang

• Visão de mundo sexualizada (a vida é produto da infinita relação entre o céu e a terra, seres humanos são, sobretudo, seres sexuais) - (3)

• Se comunica através de símbolos que contém e correlacionam múltiplas camadas de sentido.

• Preserva o elemento lunar da complexidade e mistério “obscuro” que desafia definições exatas (Wuwei: não define categoricamente)

• Vê o corpo enquanto um campo (zang-fu são vistos enquanto sistemas funcionais)

• Corpo – mente – medicina do espírito

• O médico é um intermediário ao sagrado, cultivando os papéis duais do shaman (mestre do conhecimento intuitivo) e do sábio (mestre do conhecimento escolarizado), conectando o que está acima e o que está abaixo, dentro e fora, energia e matéria.

• O médico aspira pelo Tao da medicina, um processo que requer a atualização do seu próprio caminho individual através do trabalho em se tornar uma pessoa realizada (Zhenren)

• Suas maiores ferramentas são: chi kung, meditação, música, caligrafia, pintura, poesia, viagens rituais, etc.

• Treinamento altamente individualizado baseado na relação discípulo/mestre. - (4)

• Os professores são “figuras-mestre” individuais que enfatizam a criação de uma atmosfera/cultura de inspiração na linhagem.

• A transmissão é do entendimento (pode incluir transmissão de qi do mestre ao discípulo)

• Requer uma memorização multi-direcional: memorização de textos clássicos que são interpretados situacionalmente de acordo com as circunstâncias individuais

• Saúde é definida como o processo ativo de refinar a essência do corpo e cultivar as forças vitais: conceito de vida nutritiva/alimentadora (maximizar as funções fisiológicas)

• Diagnóstico clínico primeiramente baseado numa experiência subjetiva (5) dos sentidos

• Resultado inicial primeiramente baseado no sentimento subjetivo de bem-estar do paciente (6) e na coleta de informações sensoriais por parte do médico (pulso, língua, etc.)

• Diagnóstico altamente individualizado: enfatiza o Bianzheng (diagnóstico através do padrão de sintomas)

• Tratamento altamente individualizado: defende uma aproximação terapêutica flexível que é escolhida livremente em meio a uma grande variedade de modalidades, e através delas, favorece um uso flexível de prescrições

• Uso de uma larga variedade de modalidades clínicas, incluindo a aplicação externa de ervas aos pontos de acupuntura, terapia umbilical, exercícios de chi-kung, energizações, terapia emocional baseada nos cinco movimentos, dietas alquímicas, acupuntura ziwu liushu, etc.

• Procura incluir todo tipo de prática (a prática abrange a emergência, fraturas ósseas, doenças sérias como câncer, etc.)

• Treinamento generalista (pode conduzir a uma especialização em um campo tradicional, tal como medicina externa, se inspirado pelo conhecimento clínico de um determinado professor)

• A combinação de modalidades ocidentais e tradicionais, se empregada, é feita de acordo com os critérios da medicina chinesa (por exemplo: o método de Zhang Xichun de classificar energeticamente a aspirina e integrá-la como um ingrediente alquímico dentro das fórmulas tradicionais)

Notas:
(1) Lua – móvel, impermanente, mutável (Nota da tradutora)
(2) “Devir” - processo, construção, mutação (Nota da tradutora)
(3) Citação dos clássicos: “O homem responde ao céu e à terra”. (Nota da tradutora)
(4) “Insight” (Nota da tradutora)
(5) Observação, olfação, visão, tato, audição do médico
(6) Se o espírito (Shen) está brilhante a recuperação já começou, mesmo que ainda não tenham modificações significativas nos sintomas principais.

(Compilado e traduzido a partir de artigo publicado em http://www.jcm.co.uk/SampleArticles/tcmcrisis.pdf - Science, politics and the making of “TCM”. Chinese Medicine in Crisis - Heiner Fruehauf - Journal of chinese medicine, number 61, October 1999. - Para ler o artigo na integra recorra ao site original. Tradução livre de Analyce Claudino).

Um comentário:

  1. I love this blog thanks to explain the roots of Chinese medicine as they are based on natural philosophy (taoisom) is good to know about other cultures.

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